Archive

Archive for January, 2004

O épico dias dos pais de 1996

Leiam. Vale a pena.

Eu tinha 6 anos, meus irmãos, 4 e 1. Nada lembro, mas meus pais me contaram essa fantástica História. Eles precisaram jurar para mim que era verdadeira, porque ela é algo inacreditável. Mas, sim, tudo que lerão é verdade:

Meus sábios pais resolveram comemorar o dia dos pais em Santos, comendo peixe e depois curtindo uma praia. Pegaram os três filhos pequenos, jogaram dentro do carro velho (uma mania de família?) e desceram a serra. Chegamos cedo em Santos e para aproveitar o dia, meus sortudos pais nos levaram para o aquário, para ver os belos peixes e o famosíssimo leão marinho. Uma pena que era domingo e o aquário estava fechado (1). (contem comigo).

Dirigindo pela avenida da praia, em direção ao centro, onde há restaurantes bons, meu pai estava sossegado, mas algo atormentava minha mãe. “Não está sentindo? Está cheirando gasolina”. Meu pai disse “Relaxa, está tudo bem”. Dez minutos depois o carro estava parado (2) e meu pai ligando para um amigo da cidade para ajudá-lo.

Fizeram uma gambiarra. Tamparam o local de onde estava vazando combustível com um pedaço de madeira encontrado na calçada. Enquanto meu pai ia para a mecânica, no instinto de que a gambiarra ia dar problema, o amigo dele levou minha mãe, eu e meus irmãos para a casa dele. A mulher dele, antipática, não nos tratou bem. Deu comida fria para comermos e nada para a minha mãe (3), senão cara feia.

O amigo do meu pai foi encontrá-lo na mecânica. O problema do carro era grave e a gambiarra ia realmente ter conseqüências ruins. Segundo o mecânico, meu pai e seu amigo bem intencionado haviam tampado uma saída importante de ar do carro, e havia o risco de uma pequena explosão na peça, por causa do inevitável aumento de pressão. Para consertar o veículo, meu pai teve que ficar sócio de um plano de seguro (essa parte da história não entendi direito), que não foi barato para a época (4). Não havia jeito. O carro ficaria, passaria uma noite agradável nas mãos de mecânicos. Pelo menos ganhamos uma carona até a rodoviária.

Não queriam deixar meus pais viajarem com crianças, pois estávamos sem documento. Meus pais, como iam apenas fazer um bate-volta na praia, não levaram nossos documentos e estavam com roupas de praia: chinelo, shorts curtos, camisetas velhas. Eu e meus irmãos também estávamos com o mesmo tipo de vestimenta. Certeza que o cara da rodoviária achou que era seqüestro ou coisa assim. Não houve maneira de convencer o camarada de que éramos filhos legítimos. Meus pais tiveram que ir ao juizado de menores pegar uma autorização (5) para podermos viajar.

Lá no juizado não foi problema, exceto pela fila. Autorização na mão, voltamos à rodoviária. Na hora de passar onde antes havíamos sido barrados, meu pai apresentou para o funcionário (era outro) a autorização, mas o rapaz educado disse que não era necessário (6). Meus pais respiraram fundo e entraram no ônibus. Todos olhando para eles, afinal, estavam suados, sujos, com fome e filhos pequenos. Uma cena do inferno.

O ônibus estava para sair quando meu irmão caçula atirou a chupeta pela janela e começou a chorar (7). Meu pai gritou “espera, motorista!”, desceu do carro, e descobriu que a chupeta havia caído em uma pequena poça de óleo. Mesmo assim, pegou-a e a levou de volta ao ônibus. Meu irmão não parava de chorar. Meus pais não podiam dar a ele uma chupeta melada, mas o pessoal do ônibus, que já estava olhando feio, começou a olhar mais feio ainda, agora incomodados pelo garotinho sujo. Não deu outra, meu pai, corajosamente, chupou todo o óleo da chupeta (8) e a deu ao meu irmão. Silêncio e paz.

Chegamos a São Paulo sem problema (????). Meus pais se deram o direito de pegar um táxi e voltaram, finalmente, para casa. Exaustos, sujos, suados, cansados… Tudo que precisavam era um banho quente para esquecer o agonizante dia. Minha mãe teve um gostinho da água quente, porque pouco depois de ligar o chuveiro, acabou a luz (9).

Categories: Crônica